Segunda-feira, 03 de agosto de 2015
Luiz Dourado, conselheiro do Conselho Nacional de Educação (CNE), destaca a importância do texto ensejador do MEC "Instituir um Sistema Nacional de Educação: agenda obrigatória para o país"
A Secretaria de Articulação com os Sistemas de Ensino (SASE), criada pelo MEC para estimular a cooperação federativa e desenvolver ações para a instituição do SNE, vem trabalhando fortemente o tema, em intenso diálogo com a comunidade educacional. Como resultado recente, o MEC tornou público o texto Instituir um Sistema Nacional de Educação: agenda obrigatória para o país. Nesse sentido, a SASE/MEC ouviu o especialista Luiz Fernandes Dourado, professor titular e emérito da Universidade Federal de Goiás, membro do Conselho Nacional de Educação e do Fórum Nacional de Educação e ex-editor chefe da Revista Retratos da Escola, da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE).
Dourado destaca que a instituição do Sistema Nacional de Educação (SNE) é uma demanda histórica dos segmentos educacionais: "é importante destacar que as Conferências Nacionais de Educação – desde a Conferência Nacional de Educação Básica (2008), a Conferência Nacional de Educação (2010), até a Conferência Nacional de Educação (2014) –, preveem o SNE como uma grande centralidade, quer dizer, se entende a importância política de se pensar uma maior organicidade para a educação nacional. Por isso que a agenda do sistema nacional se coloca como imperativo e, sobretudo a partir da aprovação da Emenda Constitucional nº 59/2009, se tem essa articulação do sistema com o Plano Nacional de Educação (PNE), o qual prevê a instituição do SNE".
Dourado ressalta que é importante pensar o SNE, pois a partir dele se determina uma lógica de organização e gestão da educação nacional: "A organização do sistema nacional significa uma perspectiva de federalismo cooperativo no campo educacional, permitindo, com base no sistema, ter proposições, concepções e cenários educativos que se efetivem a partir dessa articulação envolvendo União, estados, Distrito Federal e municípios, bem como seus respectivos sistemas e conselhos concernentes à questão educacional. Esse é um processo fundante".
O professor também destaca que o texto elaborado pelo MEC parte do pressuposto que o sistema está constituído, sendo necessário sua instituição: "o sistema tem bases constitucionais referendado pelo próprio PNE que define o prazo, então é necessário instituí-lo, o que significa remetê-lo a essa discussão mais ampla do federalismo e estabelecer novos marcos no processo de organização e gestão do sistema educativo nacional. Por isso, a importância de estabelecimento de um SNE, que é uma premissa histórica, amplamente defendida na seara educacional, com história na educação brasileira, mas que não se efetivou. O último texto em que essa discussão esteve presente foi na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB). Agora nós temos as condições políticas, mas, para isso, é necessário refletir sobre a agenda, que envolve as relações de cooperação, como o regime de colaboração entre os entes federados. Nessa direção está a própria concepção de sistema, que não prescinde do papel da União na coordenação das políticas educacionais, mas, ao mesmo tempo, advoga pela descentralização qualificada, ou seja, a perspectiva de se criar possibilidades, como prevê o próprio PNE, de instâncias de pactuação da educação nacional, e o sistema nacional seria, por excelência, essa configuração".
Dourado afirma ainda que: "temos várias concepções sobre sistema, embates bastante diferenciados com relação a temática, mas é importante destacar que o texto da SASE/MEC avança na medida em que recontextualiza a questão, e estabelece relação do SNE articulado às grandes questões nacionais, que, portanto, terá impacto tanto nas questões de financiamento, do Custo Aluno-Qualidade, quanto nas questões relativas a acesso, qualidade, valorização profissional e avaliação, elementos estruturais da própria dinâmica mais ampla e com uma vinculação expressa no PNE".
"É preciso avançar na discussão qualificada do texto envolvendo vários atores, entre eles, o Fórum Nacional de Educação (FNE), e as várias instâncias que o compõem.Ressalto ainda, a importância de avançar nas discussões, por exemplo, com o CNE que hoje conta com uma Comissão Bicameral discutindo a temática. Ou seja, a perspectiva do PNE em ação implica a articulação desses vários interlocutores direcionadas a instituição do SNE, dívida histórica do Estado brasileiro."
Luiz Dourado ressalta alguns aspectos do texto ensejador do SNE.
"O texto traz sinalizações importantes sobre a história política do federalismo no Brasil, situa o esforço que deverá ser feito no sentido de avançarmos nas relações de cooperação e de colaboração entre os entes federados. Avança nessa perspectiva, a partir das contribuições, porque é um texto aberto para o debate, que traz um conjunto de conceitos que busca dar argamassa à consolidação do sistema, sinaliza e respeita os atores institucionais constituídos no campo educacional e busca lhes dar autoridade, na própria relação entre os conselhos nacionais, estaduais e municipais. Há todo um sentido de apreender essa lógica federativa do estado brasileiro e de buscar avanços no âmbito educacional. Busca-se, inclusive, destacar o papel da União romper com esse aspecto patrimonial com relação à educação nacional e construir, de fato, uma agenda com potencial de participação historicamente defendido pelos segmentos".
Para o professor, todas as questões sinalizadas no documento devem ser objeto de discussão ampla e de contribuições "para que nós possamos avançar, de fato, para uma proposição de lei. Esse debate é fundamental no sentido de aproximação dos diferentes atores para discutir, inclusive, o papel da União, dos estados e dos municípios, e os arranjos normativos que deverão ser efetivados", afirmou. Pontua que:"a sintonia desse documento, por exemplo, com as deliberações da Conferência Nacional de Educação, já demonstra uma grande legitimidade. Esse já é o segundo texto em discussão e com os acúmulos e contribuições que virão, poderemos consolidar uma concepção ampla de sistema envolvendo os diferentes atores. Esse próprio movimento é formativo e fundamental. Para muitos a discussão é nova e para outros a discussão já começa a se aproximar, acho que esse movimento, coordenado pelo MEC, tem também um papel fundamentalmente formativo, e, no limite, o que ganha centralidade nesse debate é o sistema nacional, para fazer avançar e garantir o direito à educação. São esses os desafios e a questão é complexa, requer, de fato, um exame minucioso, uma participação ampla".
Na sua concepção, o sistema nacional de educação deve ser entendido como expressão institucional de um esforço organizado e permanente do estado e da sociedade, compreendendo os sistemas de ensino da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios, bem como das instituições públicas e privadas de natureza educacional, como defendido no documento da CONAE 2014. Para ele, o documento está em sintonia com esse olhar de construção ampla, no seu próprio processo de construção vivenciando essas relações de colaboração. O amplo diálogo a partir de um texto ensejador e não de uma proposição já acabada é um aprendizado; parte fundante para a construção e instituição do SNE; para o desenho da coordenação federativa; para avanços duradouros no campo educacional e, sobretudo, em face aos desafios, desde a universalização da educação básica obrigatória de 4 a 17 anos, até 2016, ao conjunto das outras metas estratégicas, inclusive a questão atinente ao financiamento, a perspectiva dos 10% do PIB para a educação nacional, as questões atinentes a organização e gestão: "há uma sinalização muito positiva da educação nacional, mais uma vez, para instituir o SNE, na perspectiva colocada pelo documento de fortalecimento dos diferentes entes federados, e precedido do papel da União na coordenação das políticas educacionais. Temos denominado esse processo de descentralização qualificada, que não apenas respeita, mas considera os diversos entes e sinaliza numa perspectiva de fortalecimento das instâncias, dos conselhos, dos fóruns e de outros setores articulados para uma concepção de educação e de gestão democrática que garanta a ampliação do direito a educação para todos, da educação básica a educação superior".
Sobre o processo de instituição do SNE, analisa que, na premissa constitucional, é papel da União, representada pelo MEC, a coordenação das políticas educacionais: "é quem tem uma centralidade nessa discussão, até porque, se acompanharmos os últimos anos, o conjunto de políticas efetivadas, a própria proposição do PNE encaminhado pelo governo federal em 2010, aprovado em 2014, teve uma participação ativa e fundante do MEC. Então, pensar o sistema nacional é refletir no sentido da efetivação do pacto federativo, do sistema de sistemas na área educacional. Pela sua própria trajetória histórica do MEC e, sobretudo, pelas mudanças que efetivou nos últimos anos do ponto de vista da educação inclusiva; de reforço a concepções e a busca de maior articulação com os demais sistemas de ensino, este é o ente responsável por articular esse debate, tanto que produziu o texto nessa direção, se dispondo a abrir a discussão e fazer uma construção coletiva. Desse modo, a coordenação do processo, ao meu ver, compete ao MEC, que certamente já iniciou seus trabalhos ao submeter o texto em busca de novos olhares a partir das contribuições. Nessa construção, inclusive, deve envolver os diferentes setores, como o Conselho Nacional de Educação (CNE), o Fórum Nacional de Educação (FNE), as entidades do campo educacional, as instituições de educação básica e educação superior, e os sistemas de ensino, de modo a construir uma política que seja a expressão da sociedade brasileira."
Dourado finaliza, "é uma discussão ampla que, por exemplo, tem impacto na discussão dos sistemas federal, estaduais, distrital e municipais, e seus respectivos conselhos. Se nós observarmos o papel do ministério, hoje, no tocante a implementação do PNE, certamente a agenda do sistema nacional é a da sua alçada, isso está posto inclusive no Plano Nacional de Educação, cuja coordenação é precípua do MEC em articulação com estados, Distrito Federal e municípios".
Professor Emérito da UFG, ao lado do então reitor da UFG, Edward Madureira (à esquerda) , em lançamento da Revista da CNTE, ao lado do Presidente da entidade, Roberto Franklin de Leão (centro), e falando à CONTEE (à direita)
Redação SASE/MEC
(A entrevista com o Professor Dourado foi realizada no dia 31/07.)
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